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FAMÍLIA, Características e Funções

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Na família humana, os contextos naturais são construções socioculturais. Os contextos naturais permitem ao indivíduo utilizar toda a variedade de recursos culturais ao longo do seu processo evolutivo. A família joga, desta forma, um papel fundamental na concretização da cultura para as crianças e jovens em desenvolvimento. Com efeito, a família constitui, por si própria um cenário sociocultural e ao mesmo tempo o filtro através do qual as crianças acedem às actividades e instrumentos típicos dessa cultura que por sua vez e através da sua apropriação as torna aptas a intervir no meio envolvente.

Assim, o papel fundamental dos pais não consiste apenas em assegurar a sobrevivência (alimentação e satisfação das necessidades primárias de calor, higiene e bem estar) dos filhos, mas a garantir a sua integração sociocultural. A esta função, alguns autores como Papousek e Papousek, 1995 chamam de parentalidade intuitiva função que permite e torna possível o acesso dos bebés ao diálogo, aos símbolos e à linguagem. A interacção entre pais e filhos está orientada para manter uma estreita comunicação, primeiro não-verbal, depois verbal, desde idades muito precoces. As características desta comunicação – sincronia, reciprocidade e ritmicidade estão especialmente vocacionadas para apoiar a emergência dos processos de simbolização e de linguagem.

Características das famílias actuais

 

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Grandes transformações que afetam:

·        Aspectos demográficos:

Acesso da mulher ao mundo do trabalho, já não por questões de mera sobrevivência económica mas porque o trabalho constitui, hoje, uma componente essencial da sua própria identidade. Uma vez no mercado de trabalho, já não saem mais de lá como acontecia outrora, nem pelo facto de se casarem, nem de terem filhos: efeitos sociais e legais importantes: equilíbrio de poderes e divisão de tarefas dentro de casa

Drástica diminuição do número de filhos

Alargamento do número de anos da presença dos filhos em casa

Mudança do modelo tradicional (Agrupamento nuclear composto por um homem e uma mulher unidos pelo matrimónio, com filhos tidos em comum, todos debaixo do mesmo teto; o h. trabalha fora de casa e aufere os meios económicos necessários para garantir a subsistência da família. A mulher cuida da casa e dos filhos) da família

Da visão monolítica da família à visão pluralista:  – coabitação ou matrimónio, filhos dentro e fora do matrimónio, uniões homossexuais, famílias monoparentais.

Para se falar de família, não é necessário que haja matrimónio: as uniões matrimoniais ou consensuais dão origem a novas famílias;

Famílias com filhos adoptivos ou por resultado de técnicas de fertilização assistida ou filhos de outras ligações.

A mulher não se dedica exclusivamente aos filhos mas a outro tipo de trabalho fora de casa.

O pai, por sua vez, já não é um mero gerador de recursos, mas pode implicar-se activamente no cuidado e na educação dos filhos.

O n.º de filhos baixou significativamente e, em muitos casos, é apenas um.

As famílias reconstruídas são hoje uma realidade.

Então qual é o conceito actual de família?

É uma união de pessoas que partilham um projecto de vida comum que pretendem duradouro, onde se geram fortes sentimentos de pertença ao grupo, existe um compromisso pessoal entre os seus membros e se estabelecem intensas relações de intimidade, reciprocidade e dependência.

Daqui resulta:

1º Interdependência, comunicação e a intimidade entre os adultos implicados

2º Uma relação de dependência estável entre quem cuida e educa, por um lado, e que é cuidado e educado, por outro

3º A relação está baseada num compromisso pessoal de largo alcance dos pais entre si e dos pais com os filhos

Funções da família

A família é, antes de mais, uma importante rede de apoio pessoal e social pelo que é importante destacar a sua eficácia e a sua adaptação às circunstâncias.

Antes de nos situarmos nas funções da família relativamente ao papel que desempenham junto dos filhos, importa situar o significado de ser pai e mãe.

1º Tornar-se pai e mãe significa por em marcha um projecto de vital educativo que supõe um longo processo que se inicia no nascimento dos filhos e contempla todo o seu processo de crescimento, socialização e desenvolvimento.

2º Converter-se em pai e mãe significa implicar-se numa profunda implicação pessoal e emocional que deverá respeitar as exigências da assimetria existente entre pais e filhos.

3º Ser pai e mãe significa desenvolver e realizar todo um conjunto de tarefas de acordo com o projecto educativo traçado.

Quatro funções básicas da família:

1º Assegurar a sobrevivência dos filhos, o seu crescimento, a sua socialização, nas suas condutas básicas de comunicação, diálogo e simbolização

2º Assegurar um clima de afecto e apoio sem os quais o desenvolvimento psicológico são não será possível O clima de afecto implica a criação de relações de apego, um sentimento de relação privilegiada e de compromisso emocional. A família constitui um ponto de referência psicológico.

3º Dar a estimulação necessária para capacitar os filhos a melhor se relacionarem e intervirem no meio envolvente.

4º Tomar decisões face a outros contextos educativos que, a par da família, se encarregaram de educar, já que os pais de hoje não podem abarcar a responsabilidade e a operacionalização de todas as tarefas educativas de que a criança e o jovem necessitam para que no futuro possam intervir eficazmente na sociedade.

Factores de protecção e factores de risco na vida familiar

Importa ao analisar os factores de tensão e de protecção que gravitam sobre a família ter presente a análise de Bronfenbrenner sobre a ecologia do desenvolvimento humano. Com efeito, este autor considera que o desenvolvimento humano é marcado por um sistema de influências que vão das mais próximas às mais distantes, sistemas que configuram e definem o meio ecológico em que o desenvolvimento se produz. A sua análise é de extrema utilidade para descrevermos os factores de protecção e de risco a que a família está exposta.

Para o autor, 4 tipos de sistemas influenciam a família, mantendo entre eles uma relação muito próxima:

-Macrossistema

-Exossistema

-Mesossistema

-Microssistema

Macro – é o sistema mais distante relativamente ao indivíduo e inclui os valores culturais, as crenças e as situações e acontecimentos históricos que definem a comunidade em que a família vive e que pode afectar os restantes sistemas (prejuízos sexistas, a valoração do trabalho, a depressão económica…).

Exo – Integra as estruturas sociais formais e informais que influenciam e delimitam os acontecimentos e os comportamentos dos ambientes que estão mais próximos do indivíduo (família alargada, condições e experiências de trabalho, amizades, relações de vizinhança…)

Meso – Refere-se ao conjunto de relações entre dois ou mais microssistemas nos quais o indivíduo em desenvolvimento participa de forma activa (família-escola.

Micro – É o sistema ecológico mais próximo e compreende o conjunto de relações entre o indivíduo em desenvolvimento e o ambiente mais próximo em que se desenvolve – família e escola

Factores de tensão e risco

MACRO

Tempo laboral – tempo completo, jornada extensa – aliado a carência de recursos locais para deixar os filhos no período extra-escolar. Sai de casa com a casa vazia e encontra no regresso, de novo o vazio e a ausência dos seus pais.

MESO – Ausência de articulação e coerência entre os dois microssistemas em que a criança está integrada: escola e família. Ausência de comunicação entre as instituições. Os pais delegam os poderes e a responsabilidade educativa na escola. Por sua vez a escola demite-se da responsabilidade dos seus educandos, sempre que estes não estão a pisar o espaço escolar. A intromissão e influência que os pais exercem na escolha dos amigos dos filhos não se dando conta que as escolhas dos filhos dependem, em larga medida, do ambiente familiar vivido: sempre que o clima é hostil e frustrante para os filhos é habitual que os jovens procurem outros ambientes familiares de valores e práticas opostas às da sua família: droga, delinquência, etc.

MICRO – Paradoxos educativos, ideias e condutas educativas, incompetência, falta de confiança, ambientes familiares desorganizados. A presença de toxicodependentes, deficientes, etc.. Problemas conjugais.

Factores de protecção

MACRO – Valorização da família e da vida familiar, da relação dos pais com os filhos. Índices baixos de divórcio ou atitudes tolerantes face às rupturas.

MESO – Serviços de apoio às famílias – aconselhamento, acesso aos serviços sociais, de saúde, comunitários, serviços para famílias com filhos com nee, serviços com actividades dirigidas a grupos de risco, sem esquecer as actividades de prevenção e educação e programas de sensibilização à comunidade em geral.

EXO – Redes informais de apoio constituídas pela família alargada e/ou pelas relações de vizinhança 8suporte emocional e instrumental). Sentimento de responsabilidade comunitária e partilhada

MICRO – O afecto que une os diferentes elementos, através do apego mútuo. Estilos de vida familiar mais igualitários e participativos a desfavor dos estilos familiares mais autocráticos e segregacionistas. Estabilidade, comunicação…

Actividades educativas desenvolvidas pela família

Que actividades organizam os adultos para os seus filhos?

Os adultos organizam as actividades das crianças para que elas aprendam aquilo que é valorizado pelos membros mais influentes da comunidade. Assim, é vulgar confrontarmo-nos com adultos que ensinam aos seus filhos determinadas capacidades e conhecimentos sobre o meio e progressivamente compartem com eles a realização das actividades cedendo-lhes à medida do seu cada vez melhor desempenho a responsabilidade e o controlo sobre as mesmas.

As actividades são definidas pela própria família e através do ensino, os adultos asseguram aos mais jovens a transmissão cultural, de geração em geração.

A família é fundamentalmente um contexto de relações interpessoais onde se adquirem conhecimentos, habilidades e destrezas no uso das ferramentas do mundo real. Estas aquisições fazem-se pela intervenção e acção num conjunto de actividades valorizadas positivamente pela própria comunidade de inserção.

Ao analisarmos a família e os seus valores educativos não podemos ignorar, como afirma Palacios quer as variáveis sociodemográficas da família, quer a qualidade das interacções adulto-criança.

No cenário educativo, a família tem como principais funções as de manutenção, estimulação, estruturação e controle. As três primeiras promovem respectivamente a actividade biológica/física, a cognitiva7atencional e a social/emocional do indivíduo em desenvolvimento. As duas últimas – estruturação e controle têm uma função reguladora sobre as anteriores, já que asseguram que a manutenção, a estimulação e o apoio se produzam no momento apropriado, em quantidades apropriadas e organizadas de modo conveniente para o desenvolvimento.

Manutenção – assegura a viabilidade, a integridade biológica e a sobrevivência do organismo. Cuidados de saúde apropriados, evitamento de situações de perigo: venenos, drogas, tóxicos, etc.

Estimulação permite o contacto do organismo com todas as modalidades de informação sensorial através da atenção do próprio indivíduo. Estes dados promove a informação sobre o mundo envolvente e desta forma o desenvolvimento cognitivo

Apoio – O apoio actua contingentemente às necessidades emocionais e sociais do indivíduo. O ambiente deve ser reforçante (no sentido proactivo) e responsivo (em sentido reactivo) o que aumenta a qualidade das relações estabelecidas. O apoio promove, igualmente, o desenvolvimento psicológico adaptado, o sentido de bem-estar social, confiança no mundo e competência nas relações com os outros.

Estruturação – Esta função permite apresentar às crianças uma organização óptima dos objectos, acontecimentos, encontros com os outros, actividades, etc., articulados no tempo e no espaço. Os ambientes familiares previsíveis e ordenados permitem às crianças estabelecer rotinas, ajudam-nas a aprender o significado e a função das coisas, a saber nomeá-las, a memorizar melhor as suas localizações, a resolver problemas.

O desenvolvimento cognitivo depende não só da quantidade e qualidade dos estímulos que recebe, mas também da forma como eles estão organizados num tempo e num espaço determinados. Um ambiente estruturado é, igualmente, importante para o funcionamento socioemocional dos filhos. As situações incontroláveis e imprevisíveis geram as maiores doses de ansiedade e depressão.

Controle – É o seguimento e supervisão das actividades do organismo em desenvolvimento na sua relação com as circunstâncias ambientais. A supervisão não se refere apenas às necessidades físicas e biológicas mas também às das competências cognitivas e socioemocionais do organismo.

Diferentes pais, diferentes cenários

Porque é que determinados cenários familiares cumprem estas funções de forma eficaz, enquanto outros ou não as cumprem, ou o fazem num quadro de grande precaridade?

A chave para compreendermos a diferença está, sem dúvida, nos pais. Com efeito, são os pais que dão forma ao contexto de desenvolvimento ao promover espaços de realização de actividades, rotinas culturais e práticas que permitam a participação das crianças. Estes espaços reflectem, antes de mais, as concepções dos pais sobre desenvolvimento e educação dos filhos